Há pouco, completaram-se cinco anos sem as “torres gêmeas” sob os céus da ilha de Manhatan. Muito se especula, até os dias de hoje, sob o conhecimento antecipado, por parte do presidente dos Estados Unidos, George W. Bush, da movimentação terrorista e dos planos de uma mega-ataque planejado por Osama Bin Laden e sua corja.
É bem provável que Bush soubesse. Não se pode dizer que não agiu por que lhe interessava a guerra. Possivelmente, o presidente não tomou qualquer atitude porquanto calculou que traria um enorme pânico à nação. Mas se o inimigo nº 1 de Chaves e Fidel sabia de tudo, por que não tomou atitudes preventivas no sentido de, se não impedir, mitigar os efeitos dos ataques de 11 de setembro? Por que agir apenas depois do ocorrido, com medidas como a que impede o embarque com líquidos de qualquer natureza para os vôos para os Estados Unidos? Muitas mortes poderiam ter sido evitadas.
E para os empresários, quando foi o “11 de setembro”? Não foi no ano de 2.001, mas em 1.990, com a edição da lei 8.078, de 11/09/19990: o chamado Código de Defesa do Consumidor. Por que, de um modo geral, os empresários ainda esperam o “ataque terrorista” para tomarem algumas atitudes que poderiam ter sido preventivas e não remediadoras?
Trataremos aqui algumas medidas que podem, no curto prazo, impedir que as demandas judiciais tornem nefasto o passivo das empresas, culminando com a quebra destas.
A era do cliente chato acabou! Há alguns anos, as queixas eram vistas como aborrecimento ou custo improdutivo, e aquele que reclamava levava a pecha de “criador de caso”. Tais empresas não tratavam de forma eficaz as reclamações recebidas. O cliente era visto como um “mal necessário”; seqüela, em maior parte, da falta de concorrência no segmento.
Hoje, isso não é mais permitido. Um pelo fato da megacompetição que obriga que as empresas cativem e cultivem o cliente para que tenham espaço no capitalismo canibalesco. Outro, porque a evolução jurídica obrigou as empresas a respeitarem os direitos dos consumidores; eles nunca estiveram tão bem amparados e conscienciosos de suas prerrogativas.
As empresas dos ramos de telecomunicações, instituições financeiras e planos de saúde têm os melhores e mais bem treinados empregados, com habilidades em marketing, vendas e pós-venda, treinamento inter-pessoal, etc. Mas por que, então, se investem tanto em capacitação e treinamento, são os campeões em reclamações junto aos órgãos de proteção ao consumidor? Por uma aspecto muitas vezes deixado de lado: o treinamento em prevenção jurídica.
É preciso educar os funcionários antes de treiná-los em habilidades, com foco em relações humanas. Se eles falham, a empresa perde a chance de solucionar a questão antes de se transformar numa pendência em órgão de defesa do consumidor, com mais danos à sua imagem. Cabe à empresa se antecipar e evitar problemas que possam ser enquadrados como desrespeito ao Código de Defesa do Consumidor. Este é um diferencial no mercado que não se obtém por meios de campanhas promocionais ou pesquisas de opinião, mas tão somente com a prevenção jurídica.
Há alguns anos, a Johnson & Johnson lançou uma lente de contato, da linha Acuvue, com o modelo 1 day (um dia). As lentes, como o próprio nome diz, orientavam em seu manual de uso que o consumidor deveria utiliza-las por apenas um dia e, ao final, descartá-las. Alguns tempo depois, constataram que as lentes poderiam ser utilizadas por mais de um dia; dois, três, quatro ou mais. Bastava acondicioná-las e higienizá-las como se faz com as lentes descartáveis de um modo geral. Resultado: após inúmeras ações judiciais e pressões pelos segmentos de defesa do consumidor, a famosa empresa norte-americana, de New Brunswick, sucumbiu às pressões e, em um acordo milionário, desembolsou a bagatela de U$ 800 mi. Uma pequena falha no rótulo do produto acarretou a perda de milhões de dólares pela empresa.
E assim tem sido em muitas empresas do Brasil. A falta do treinamento em prevenção jurídica tem dificultado a vida financeira das empresas. Falhas na publicidade e oferta dos produtos, nos rótulos e embalagens, cobrança indevida e inadequada de débitos, elaboração deficiente de contratos, entre outros, tem abarrotado o judiciário com ações de indenizações. Para um efeito comparativo, segundo levantamento do Superior Tribunal de Justiça, em 1993 , 28 ações chegaram a este tribunal; em 2004, foram 8201 ações. Vale lembrar que a maioria dos casos que envolvem indenizações a consumidores não chegam ao STJ, pois têm trâmite especial regido pela lei nº 9.099/90.
É necessária uma assessoria jurídica de qualidade para que se evite problemas desnecessários. Caso os tenha, que sejam resolvidos da forma mais célere possível, com acordo providencial em patamares aceitáveis ou com uma defesa capacitada que possibilite o êxito ao final da demanda judicial.
Até quando o empresariado brasileiro vai aguardar o “ataque terrorista” para implementar medidas capazes de impedir novos problemas? Com certeza, prevenir ainda é o melhor remédio, afinal, Noé construiu a arca antes do grande dilúvio. E as empresas que estiverem mais bem preparadas, serão as que superarão os períodos de dificuldades. Como disse Friedrich Nietzsche, “nenhum vencedor acredita no acaso”.
Gustavo Sardinha é sócio da Hanum Corporate Legal Advisers.