Em meio à crise econômica que o Brasil enfrenta, crescer ou até mesmo investir pode parecer inviável para empresários que vêm sofrendo com retração nas vendas, aumento da inflação e câmbio instável. Porém, mesmo com este cenário nebuloso, é possível, sim, obter recuperação no mercado. Em 2015, o volume de negociações de fusões e aquisições anunciadas de janeiro a julho de 2015 cresceu 26,1%, comparado ao mesmo período do ano passado, mas o valor envolvido nestas transações foi maior: 53,7%, se verificado igual período.
Para manter-se competitiva, a empresa muitas vezes precisa buscar recursos e financiamentos e, neste caso, as opções mais promissoras são as parcerias com fundos de investimentos ou mesmo com empresas de maior porte que estão de olho em boas oportunidades de negócios. São eles que podem dar aporte financeiro e operacional às pequenas e médias neste momento de aperto.
“É preciso reinventar o antigo modelo de pegar um dinheiro caro e de curto prazo, como empréstimos bancários, para uma estratégia mais elaborada e competitiva, por meio da parceria de empresas com investidores”- Gustavo Hanum Sardinha
Os fundos de investimentos têm sido a solução encontrada por muitas empresas para sanar as dificuldades. É que, apesar das incertezas na economia, fundos de private equity nacionais e estrangeiros, embora mais seletivos, continuam apostando em empresas brasileiras e empregando recursos para que elas cresçam e, assim, possam participar de seus resultados.
O especialista em fusões e aquisições e avaliação de empresas, Gustavo Sardinha, explica. “Em momentos de crise, não é só o dinheiro que some, mas as boas oportunidades também. Por conta disso, os fundos conquistam espaços, começam a buscar novas operações em setores diferenciados e a olhar com outros olhos para ramos de atuação antes pouco explorados, como a construção civil, shoppings e lojas de varejo em geral, sem falar no agronegócio, que continua a atrair interesse”, relata.
Segundo Sardinha, que também é sócio da B2L Investimentos – empresa especializada em consultoria para negócios estratégicos -, “fusões e aquisições podem ser fundamentais para aumentar a eficiência da empresa e a escala do negócio”.Rodrigo Bertozzi, CEO da B2L, concorda: Uma das saídas é contar com a participação de investidores no negócio – fundos de private equity e venture capital ou de outras empresas maiores; enquanto a concorrência se atola em dívidas. São esses investidores que podem dar o aporte necessário para a empresa se reerguer no mercado e até crescer. E o empresário tem que ser receptivo às novas opções e se preparar para essas possibilidades. Muitos já aderiram”, esclarece.
Bertozzi ressalta ainda que antes de tudo, é importante que o empresário entenda que os fundos estão em busca do empreendedor comprometido; com visão de longo prazo e desejo de evoluir. “Transparência e clareza na gestão são fatores determinantes, para que a parceria dê certo. Solucionar problemas internos também ajudam a enfrentar os desafios que vêm pela frente”, completa.
De acordo com Gustavo Sardinha, são principalmente duas as situações que levam o empresário a buscar investimento. No primeiro caso estão empresas que ainda não têm problemas financeiros, mas estão estagnadas, sem perspectivas de crescimento. Em outro cenário estão empresas que até o ano passado eram saudáveis financeiramente, mas como têm o crescimento sustentado em volume de faturamento – como é o caso das redes varejistas – agora veem os lucros minguarem ou já estão fechando no vermelho. Em ambos os casos, a alternativa mais viável é a entrada de novos investidores.
“Atuamos junto a uma grande rede de eletrodomésticos do Rio Grande do Sul que queria se expandir no mercado e voltar a crescer. A B2L então colocou esta empresa em contato com uma grande rede do Centro-Oeste e houve a fusão, com sucesso”, revela.
Bertozzi detalha o modelo de negócio da B2L: “Somos conselheiros de empresas de pequeno, médio e grande porte de diversos segmentos e realizamos as conexões entre empresários e investidores, inclusive internacionais. Na B2L, gerimos dados de centenas de oportunidades tanto na ponta compradora quanto na vendedora. Isto é possível por estarmos presentes em mais de cem regiões do Brasil, por meio de uma ampla rede de contatos e a alta expertise de nossos 47 sócios”, informa.
Se engana, portanto, quem pensa que, devido à economia fraca, há uma fuga de investimentos no país. “Eu mesmo imaginei que, diante deste cenário, investidores estrangeiros fugiriam daqui, mas na verdade isso não ocorreu. Eles chegam com grande apetite, em parte em razão da desvalorização do real frente ao dólar. Além disso, esses investidores apostam na recuperação do país. O Brasil é visto lá fora como vivendo em um momento de crise momentânea”, afirma Sardinha.
Os benefícios que as empresas recebem para saírem do ‘sufoco’ dependerão do momento e do grau de endividamento. Se menos endividada (ou sem dívidas), parcerias com fundos podem ser uma forma de crescimento; se mais, uma forma de se reerguer durante a crise.
“É preciso reinventar o antigo modelo de pegar um dinheiro caro e de curto prazo, como empréstimos bancários, para uma estratégia mais elaborada e competitiva, por meio da parceria de empresas com investidores”, conclui Gustavo Sardinha, da B2L.
Negociação em Goiás
Uma das grandes fusões ocorridas neste ano foi entre duas empresas do setor de alimentos, após 30 anos de sua fundação, em Goiânia, pelo ex-motorista de ônibus Antonio Benedito dos Santos, a fabricante de sorvetes Creme Mel passou a ser a maior do País, entre as controladas por brasileiros, com a aquisição da concorrente Zeca’s, do Recife. O negócio abre as portas do mercado nordestino à empresa, hoje presente nas regiões Centro-Oeste, Norte e Sudeste segundo informações do Correio do Grande Recife.
A Creme Mel faturou R$ 200 milhões em 2014 e a Zeca’s, R$ 100 milhões. Juntas, esperam expansão de 25% neste ano. Mais de 65% do mercado brasileiro de sorvetes está pulverizado entre empresas regionais e familiares. A liderança, com 21%, é da Unilever, dona da marca Kibon. A multinacional anglo-holandesa Unilever, dona da marca Kibon, é líder no mercado com participação de 21%, segundo dados de 2014 da consultoria Euromonitor. O mercado de sorvetes movimentou R$ 13,4 bilhões em 2014. Entre 2003 e 2014, o consumo teve aumento de 90,5%, para 1,305 bilhão de litros por ano, segundo a Associação Brasileira das Indústrias e do Setor de Sorvetes (Abis), mas a relação per capita ainda é baixa. Em 2014, correspondia a 6,43 litros por pessoa, ante 30 litros nos Estados Unidos.
Em entrevista à repórter Bia Mendes do DM, o diretor presidente da Creme Mel, Antônio Benedito dos Santos, ressaltou que o negócio será benéfico não apenas para as empresas, mas também para as regiões onde as unidades fabris estão localizadas, Goiânia e Abreu de Lima. “A Creme Mel é líder regional e, em Recife, a Zeca’s é líder de mercado nacional. Desta forma, a aquisição forma uma indústria 100% brasileira”, ressalta.
O valor da negociação entre as duas empresas permanecerá em sigilo, conforme Antônio Benedito, que destaca que há mais de um ano as empresas estão negociando. “Tem mais de um ano estamos em processo de negocição. Já conhecia a empresa e o antigo dono. Esta é uma região que queríamos atuar há muito tempo, então seria melhor adquirir uma empresa local do que abrir uma concorrente”, conta. Antônio Benedito ainda ressalta que os investimentos que deverão ser realizados na unidade no Nordeste é para a modernização da fábrica, para facilitar a produção. “Estamos confiantes de que a aquisição da Zeca’s não apenas formará a maior companhia de sorvetes independente do Brasil, como irá reforçar nosso comprometimento com a qualidade do produto e satisfação do consumidor para atingirmos a liderança no mercado nacional”.