Em sessão realizada em 11 de novembro de 2020 o Conselho Pleno do Conselho de Contribuintes do Estado do Rio de Janeiro negou o direito ao creditamento de ICMS decorrente da entrada de bens do ativo imobilizado utilizados em obras de construção civil.
O caso julgado tratava do creditamento, pela Petrobras, do ICMS relativo à aquisição de tubos, conexões e flanges para a construção Terminal de Cabiúnas, que tem como objetivo o transporte e armazenamento de óleo.
Os tubos, conexões e flanges foram adquiridos de empresas prestadoras de serviços de construção civil que, por sua vez, destacaram o valor do ICMS nas referidas notas fiscais, materializando, dessa forma, a existência do direito ao creditamento do ICMS.
Isto porque a Constituição Federal determina que o ICMS é um tributo não-cumulativo, gerando o direito de crédito para os adquirentes de bens e mercadorias anteriormente tributadas por esse imposto.
A não-cumulatividade do ICMS garante ao estabelecimento comercial o direito a abater os valores de ICMS pagos nas etapas anteriores, ou seja, o valor do ICMS pago pelos fornecedores.
Para ilustrar a não-cumulatividade, imaginemos um comerciante que tenha adquirido um sapato da indústria por R$ 100,00 (cem reais) e que sofra a incidência da alíquota de 12% de ICMS sobre a venda desse produto, totalizando R$ 12,00 (doze reais) de ICMS pela venda do sapato da indústria para o comerciante.
Suponhamos que o mesmo sapato tenha sido vendido pelo comerciante por R$ 150,00 (cento e cinquenta reais), sendo devido R$ 18,00 reais de ICMS pelo comerciante. Em razão da técnica na não-cumulatividade o comerciante terá que pagar apenas R$ 6,00 (seis reais), pois terá o direito de descontar os R$ 12,00 (doze reais) pagos pelo industrial referente à etapa anterior.
Essa técnica tem como objetivo assegurar que a carga tributária estipulada pelo legislador, no caso hipotético 12% (doze por cento), seja o percentual efetivamente devido na operação.
No exemplo do sapato, o valor devido ao final das duas operações, venda do industrial para o comerciante e a venda do comerciante para o consumidor final, equivalerá a 12% ou R$ 18,00 (dezoito reais), ao passo que sem a não-cumulatividade o valor do ICMS incidente sobre a operação será de R$ 30 (trinta reais), ou seja, 20% de carga de tributária.
A condição constitucional primordial para o creditamento do ICMS consiste no destaque, na nota fiscal de venda da mercadoria, do valor devido na operação, e no caso de aquisição de bens do ativo permanente, ainda deverá ser respeitada a proporcionalidade da utilização desses créditos, bem como, deve ser observada a necessidade de tais bens estarem ligados às atividades desenvolvidas pela empresa.
A autoridade fiscal autuante desconsiderou o creditamento, pois entendeu que as fornecedoras dos bens são empresas de construção civil e, portanto, são prestadoras de serviços, o que impõe a incidência do ISS e não do ICMS na venda dessas mercadorias para Petrobras, bem como, entendeu que a construção de oleoduto não se enquadra na atividade fim da empresa.
Em outras palavras, a aquisição dos tubos, conexões e flanges por empresas de construção civil estão sujeitas à incidência do ISS, sendo indevido o destaque do ICMS e consequentemente o creditamento pela adquirente, adicionando-se, ainda, que a construção do oleoduto não tem pertinência com a atividade desenvolvida pela empresa.
O Conselheiro relator José Augusto Di Giorgio reconheceu a legitimidade dos créditos e o Conselheiro Ricardo Garcia de Araujo Jorge também acompanhou o conselheiro relator, e registrou seu posicionamento, em declaração de voto, no sentido de que é irrelevante o fato das empresas serem prestadoras de serviços para fins de creditamento, pois não se trata no caso da produção de bens pela prestadora de serviços, e sim de bens adquiridos pela prestadora de serviços e revendidos para a Petrobras, até porque, ressaltou o conselheiro, não há provas de que os bens tenham sido tributados pelo ISS.
O conselheiro Ricardo Araujo ressaltou também que a construção do oleoduto não pode ser considerada como atividade estranha à empresa de extração e exploração de petróleo, devendo ser considerados todos os créditos ligados a tudo o que a empresa faz para atingir seus objetivos institucionais.
No entanto, acabou prevalecendo, pela maioria de votos, o entendimento pela manutenção do auto de infração, seguindo o precedente do próprio Conselho Pleno no julgamento do recurso 67.239.
A decisão parte da premissa de que somente poderia ser tributado pelo ICMS os materiais produzidos fora do local da prestação de serviços, nos termos no item 7.02 da lista anexa à Lei Complementar 116/2003, sendo indevido o destaque o ICMS na nota.
Acrescenta a decisão, ainda, que a atividade de construção civil é alheia a atividade da Petrobras, o que também justificaria a negativa de crédito.
Ressaltou um dos conselheiros que, tratando-se de empreitada por preço global, a contratação do serviço abrangeria a prestação de serviços e a aquisição dos materiais, com a consequente incidência do ISS.
A questão não é pacífica, até mesmo porque a Receita Federal do Brasil, ao analisar os percentuais a serem aplicados no lucro presumido nas atividades de construção civil, entendeu que a empreitada global não deve ser enquadrada como prestação serviço, devendo ser considerada prestação de serviço somente se houver fornecimento parcial de materiais ou não houver fornecimento de material.
Há julgados favoráveis ao creditamento no Poder Judiciário, como a decisão monocrática REsp 1.750.309 do Minsitro Hermam Benjamim que considerou válido o creditamento de bens do ativo para a construção de gasoduto.
Portanto, é muito provável que o debate continue no Poder Judiciário, uma vez que as atividades de construção civil acabam sendo de natureza mista, ou seja, elas envolvem prestação de serviços e venda de mercadorias, o que torna a tributação, sob vários aspectos, passível de discussão.